Por Marcelo Vieira*
Quando os fundadores de uma startup estão iniciando sua jornada empreendedora, o único e principal foco é validar o modelo de negócios. A cultura dessa empresa em formação não entra no radar de preocupações – até porque muitas vezes ainda não existe nem equipe para vivenciar uma cultura. No entanto, é comum que o tema continue sem receber a prioridade devida conforme o negócio prospera, o que se torna um risco para o sucesso da organização.
Durante o período em que a empresa é pequena (até 50 pessoas), a cultura é basicamente a composição do jeito de ser dos fundadores. Entenda por jeito de ser seus valores, crenças e comportamentos. Se um empreendedor tem um estilo mais descolado e informal, é essa a cara que ele vai tender a dar ao ambiente. Outro empreendedor com uma crença forte de que o resultado vem antes do equilíbrio pessoal/profissional vai priorizar para o time pessoas com orientação similar. Não tem certo ou errado aqui.
Enquanto os sócios são capazes de conviver diariamente com todas as pessoas da startup, a cultura é disseminada e reforçada de forma direta e natural. Os desafios começam a ficar maiores quando eles não mais conseguem interagir de forma constante com todos os seus colaboradores. Este é o sinal de que a cultura deve passar a ser tratada de forma mais estruturada.
Marc Randolph, cofundador da Netflix – que esteve recentemente no Brasil – credita o sucesso do modelo inovador da empresa à definição, desde cedo, de uma cultura baseada no teste contínuo e sistemático de novas ideias. Esse é um exemplo de cultura que já nasce conectada à estratégia do negócio.
O perfil do time, os comportamentos, os mecanismos de recompensa, o nível de tolerância ao erro, o ambiente de trabalho, e todas as demais ações táticas e operacionais se tornam desdobramentos naturais de um direcionador claro.
O primeiro guardião e principal patrocinador da cultura de uma startup deve ser o CEO. De forma prática, ele é o responsável por três missões: garantir que estratégia e cultura nasçam juntas e se mantenham conectadas; medir os resultados da liderança não apenas pelas entregas técnicas, mas também pela capacidade de promoverem a cultura em seus times; ser o exemplo vivo do jeito de ser da empresa, mantendo a coerência entre discurso e prática.
Conforme a startup cresce, o CEO precisa de apoio na sustentação da cultura. E aí surge o papel do RH moderno, com a missão de traduzir a essência da empresa em rituais e processos de comunicação interna, acompanhamento e celebração de resultados, atração de novos talentos, e evolução do público interno.
Três indicadores essenciais são: a satisfação dos colaboradores (que pode ser medida, por exemplo, pelo Employee NPS), o índice de confiança na estratégia (que pode ser avaliado em uma escala 1-5), e o People Churn (Total de Saídas Voluntárias de Colaboradores/Total de Saídas de Colaboradores).
Peter Drucker uma vez disse que “a cultura engole a estratégia no café da manhã”. O sucesso da Netflix, e de outras tantas startups que escalam, parece indicar que vale muito a pena cultivar estratégia e cultura lado a lado desde os estágios iniciais da empresa, por mais que o radar de prioridades pareça apontar em outra direção.
Assim, ao invés de desconexos – ou até concorrentes – esses dois elementos combinados proporcionam clareza, foco e consistência para alavancar o crescimento do negócio.
*Marcelo Vieira, Diretor de Cultura Organizacional da Hi Platform